Ouço os passos. Não sei se os ouço na realidade. O soalho de madeira range e estala. Sem que ninguém o pise estala durante todo o dia. Por vezes, quando o ouço estalar a meio da noite, suspendo a respiração, como se também ela me assustasse. Treino este meu temor no silêncio estalado da noite. Há anos atrás quando era menina precisava de acender a luz no início do corredor para o conseguir percorrer até ao final. Ao temor do escuro juntavam-se as badaladas do relógio que tocava na cozinha. Fui-me deixando crescer ao som daquela música, ao som daquele ranger de passos. No percurso do meu corredor desapareceram vozes e sombras, nasceram passos novos e o som de outras tábuas a estalar debaixo dos pés. No silêncio da noite, quando a madeira estala e eu sustenho a respiração, imagino as sombras que desapareceram a abeirarem-se da minha cama. Sinto-lhes a respiração e o cheiro. Abro os olhos no escuro e tenho-me apenas a mim por companhia.
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