Grafia

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quarta-feira, 17 de março de 2010

Tia Loja


Esta imagem levou-me a mim quando era pequena. À minha infância onde houve uma aldeia. Era uma aldeia bem pequenina, daquelas que têm um nome estranho e cuja localização no mapa não era muito preceptível num tempo em que auto-estradas eram coisa nunca vista e o GPS uma maquineta própria do "Espaço 1999". Nesta aldeia havia carroças e motoretas. Os que tinham carro eram os que tinham vindo para a cidade e estavam "bem" na vida. Havia um grupo de ciganos que todos os Verões se instalava numa casa de pedra que é agora pertença de familiares meus. Havia a romaria de grupos de homens e mulheres contratados sazonalmente para a apanha dos figos, do tomate e das uvas. Não havia água canalizada mas havia uma fonte onde se ia buscar água, com jarros ou vasilhas de barro transportadas à cabeça num equilíbrio perfeito assente em rodilhas feitas de bocados de trapos (sogras). Havia pessoas capazes de "deitar o mau olhado" e outras que faziam umas rezas com água e azeite para desfazer o dito. Na minha memória são felizes os dias nesta aldeia. Onde não existiam mini-mercados. O pão era amassado e cozido nas casas que tinham forno ou então vendido pelo padeiro que vinha numa carrinha que parava no centro da aldeia, buzinando para avisar da sua chegada. Tal como o senhor do peixe. Não havia ASAE e as carrinhas eram vulgares. Ovos, galinhas, coelhos e outras carnes eram produto de criação individual/familiar. Na minha família havia uma loja. A parte de baixo de uma casa desabitada. Um espaço enorme, amplo, escuro e fresco nas tardes de Verão que ali passavamos a brincar. Era uma loja mista onde se acumulavam amendoins, tremoços, pevides, rebuçados, leguminosas em grandes tulhas de madeira com medidas também de madeira, gasosas e laranjadas, bolachas de baunilha vendidas em pacotinhos individuais. Não havia máquina de café, mas havia enormes pipas de vinho e copos de três que os homens engoliam como se bebessem copos de água. E nós, meninos da cidade onde as lojas eram distintas consoante o género que vendiam, deslumbravamo-nos na loja da Tia Teresa (a "Tia Loja"). Em mesas de madeira já muito gastas e bancos de furo no meio do tampo. E brincavamos às casinhas, às mães e filhos, às lojas. Na rua principal daquela aldeia os dias eram quentes mas enormes. Eram dias cheios de brincadeira e de tempo de sesta durante as horas de maior calor. Eram dias que terminavam em espreguiçadeiras na rua a olhar as estrelas que transformavam o escuro do céu num manto de luzes prateadas. Hoje tive saudade da aldeia, da loja, das tardes, das noites e das pessoas que existiram comigo nesse tempo.

1 comentário:

Maria Carlota Narciso disse...

Engraçado estamos em sintonia de pensamentos. Também eu tive na minha infância e adolescência férias deste tipo. E ainda hoje recordo esses dias felizes.

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